A recente escolha do eleitorado por partidos de centro e direita reforça uma mensagem clara: a esquerda precisa de um projeto político que dialogue com as necessidades econômicas e de segurança dos brasileiros. Enquanto temas como responsabilidade fiscal e segurança dominaram as campanhas, a esquerda ainda carece de uma proposta que atenda diretamente às demandas concretas dos cidadãos, especialmente em um momento em que os municípios pedem soluções práticas para o desenvolvimento local e a inclusão digital.
Um Programa Nacional de Cooperativas de Tecnologia e ComunicaçãoUma proposta que pode responder a essa demanda é a criação de um Programa Nacional de Cooperativas de Tecnologia e Comunicação. Esse programa visa estabelecer cooperativas em cada um dos 5.570 municípios brasileiros, proporcionando autonomia tecnológica e fortalecendo o tecido econômico local. A iniciativa é tanto prática quanto radical: cada cooperativa seria uma unidade de inteligência, pesquisa e desenvolvimento de soluções tecnológicas voltadas para a comunidade, além de funcionar como um centro para a inclusão digital e o desenvolvimento de habilidades locais.
Implementação do Serviço Digital BrasileiroEntre as funções dessas cooperativas, uma em especial se destaca: apoiar a implementação de um Serviço Digital Brasileiro, uma proposta da Comunidade de Software Livre. Esse serviço tem como objetivo estabelecer uma Infraestrutura Digital Federada do Estado Brasileiro que possa integrar plataformas públicas de forma transparente e segura, baseada em software livre. Cada cooperativa seria responsável por manter um pequeno data center local, assegurando que cada município tenha a infraestrutura necessária para oferecer serviços digitais de maneira acessível e eficaz. Isso inclui não só suporte para sistemas municipais, mas também a criação de canais de comunicação pública que permitam o diálogo direto entre governos e cidadãos, fortalecendo a transparência e a participação cidadã.
Geração de Emprego e Sustentabilidade LocalAlém de dar suporte à oferta de serviços públicos digitais, essas cooperativas seriam centros de criação de empregos e desenvolvimento técnico, oferecendo oportunidades locais em áreas como manutenção de infraestrutura, segurança digital e análise de dados. Esse modelo não só impulsionaria a economia, mas também daria às comunidades uma autonomia real para gerenciar suas necessidades tecnológicas. E, com um modelo de financiamento similar ao do Sistema S, as cooperativas poderiam operar de forma autônoma e sustentável ao longo do tempo, utilizando recursos que incentivem o desenvolvimento local sem depender exclusivamente de grandes empresas de tecnologia.
Viabilidade Econômica da PropostaA implementação desse programa é viável no cenário econômico atual. Com a redução de 1% na taxa de juros da dívida pública, estima-se uma economia anual de aproximadamente R$ 65 bilhões. Destinando 10% dessa economia, ou seja, R$ 6,5 bilhões, seria possível financiar a criação e manutenção das cooperativas em todos os municípios brasileiros.
Para contextualizar, em 2020, o governo federal contratou R$ 2,5 bilhões em serviços de tecnologia da informação, representando um aumento de 18% em relação ao ano anterior. Esse montante demonstra que o investimento proposto para as cooperativas é compatível com os gastos atuais em TI, com o diferencial de promover desenvolvimento local e autonomia tecnológica.
Um Programa Nacional de Plataformas PúblicasA destinação de R$ 3,5 bilhões desse programa poderia, ainda, viabilizar um Programa Nacional de Plataformas Públicas, criadas e mantidas por instituições sem fins lucrativos, como as cooperativas de tecnologia. Diferente de plataformas governamentais, essas seriam plataformas de interesse público, nos moldes da Wikipedia.org ou da Plantaformas.org, oferecendo uma alternativa digital que prioriza o bem comum.
Como primeira encomenda dessa rede de cooperativas, o foco seria desenvolver alternativas de software livre para as Big Techs, como Instagram, Facebook, YouTube, Spotify, Uber e iFood, garantindo ao cidadão ferramentas locais que respeitem sua privacidade e proximidade de dados. Essa rede não só abriria espaço para inovação e inclusão digital, como tornaria o Brasil menos dependente de grandes conglomerados, criando um ambiente digital mais seguro, sustentável e alinhado aos interesses sociais.
Essas novas plataformas seriam projetadas para mais que apenas respeitar a privacidade e proximidade dos dados dos cidadãos. Elas teriam um papel crucial de devolver aos trabalhadores o poder sobre suas próprias condições de trabalho e renda. Em vez de reforçar um modelo de exploração, onde grandes plataformas concentram lucros, essas cooperativas criariam um ambiente onde os próprios trabalhadores possam alcançar uma geração de renda justa e sustentável, sem que um capital estrangeiro ou uma grande empresa extraiam seus ganhos.
Além disso, o ambiente cooperativo e comunitário dessas plataformas incentivaria a inovação aberta e a criação de novas ferramentas, sem as barreiras impostas pelo controle de um pequeno grupo. A lógica deixaria de ser aquela em que um milionário estrangeiro lucra às custas dos trabalhadores, para uma em que os próprios trabalhadores, por meio das cooperativas, propõem e utilizam ferramentas de uso comum, fortalecendo suas comunidades.
Essa visão de plataformas públicas e cooperativas responde diretamente aos anseios do eleitorado atual, que busca desenvolvimento econômico e segurança em soluções que se integrem ao seu dia a dia. É uma proposta que não apenas confronta os modelos de exploração, mas também se alinha aos desejos de estabilidade e autonomia econômica manifestados nas urnas.